Stage 0 não é só sobre ideias, é sobre entender problemas reais
O Stage-Gate tradicional começa oficialmente no chamado Stage 0, ou “Descoberta”. É o momento de explorar oportunidades, identificar necessidades e gerar ideias que possam alimentar o pipeline de inovação. No entanto, muitas organizações ainda tratam essa fase como uma etapa de brainstorming isolada, desconectada da realidade do usuário.
É aí que entra o Design Thinking — uma abordagem que vai muito além da criatividade. Com foco na empatia, experimentação e cocriação, ele ajuda times a mergulharem de fato no contexto do problema antes de correr para a solução. E esse passo é essencial para evitar desperdícios, priorizar o que importa e aumentar as chances de sucesso em etapas posteriores do Stage-Gate.
De acordo com a consultoria Forrester, empresas que incorporam práticas de Design Thinking nos estágios iniciais de inovação conseguem reduzir em até 50% os ciclos de desenvolvimento e aumentar a taxa de adoção de novos produtos em mais de 30%.
Design Thinking como antídoto para “solucionismo prematuro”
É comum que equipes entrem em um projeto de inovação já com uma ideia pronta — ou, pior, com uma solução esperando um problema. Isso gera o chamado solucionismo prematuro, um erro que compromete não só a utilidade do projeto, mas também sua viabilidade e aceitação futura.
O Design Thinking propõe inverter essa lógica. Em vez de começar com uma solução, começa-se com empatia: ouvir, observar e compreender as dores reais do usuário. Ferramentas como entrevistas em profundidade, shadowing e mapas de empatia ajudam a construir uma visão rica e fundamentada da experiência das pessoas. E é a partir desse diagnóstico que surgem ideias mais relevantes, viáveis e desejáveis.
Quando esse processo é bem conduzido, o Gate 1 — que normalmente analisa se o projeto deve ou não seguir para a fase de escopo preliminar — deixa de ser um ponto de decisão com base em achismos e passa a se apoiar em insights validados com usuários reais. Isso torna as decisões mais robustas e diminui o risco de investir em algo que não gera valor.
Prototipar para pensar: aprendendo com o erro enquanto ainda é barato
Outro pilar fundamental do Design Thinking é a prototipação rápida. Não se trata de construir o produto final, mas sim de criar versões simples — e às vezes até toscas — que permitam testar conceitos, funcionalidades ou experiências antes de investir pesado em desenvolvimento.
Essa prática casa perfeitamente com os estágios iniciais do Stage-Gate. Inserir ciclos curtos de teste e aprendizado entre o Discovery e o Gate 1 permite não apenas validar hipóteses, mas também refinar escopos, priorizar funcionalidades e identificar riscos ocultos.
De acordo com estudo da Nielsen Norman Group, equipes que testam protótipos nos primeiros 10% do ciclo de desenvolvimento identificam quase 85% dos problemas de usabilidade logo no início, economizando tempo, recursos e retrabalho.
Integrando o Design Thinking ao fluxo Stage-Gate: do caos criativo à inovação com direção
Apesar de suas origens diferentes, Design Thinking e Stage-Gate não são metodologias conflitantes. Pelo contrário — elas se complementam de forma poderosa quando bem integradas. Enquanto o Stage-Gate oferece estrutura, disciplina e controle, o Design Thinking introduz flexibilidade, empatia e iteração, sobretudo nos estágios iniciais.
A chave está em encaixar o Design Thinking no momento certo do processo Stage-Gate, especialmente antes e durante o Stage 1 (avaliação preliminar). Esse é o ponto ideal para aplicar as fases clássicas do Design Thinking: Empatizar, Definir, Idear, Prototipar e Testar.
- Empatizar e Definir acontecem no Discovery (Stage 0), onde a equipe se dedica a entender profundamente os usuários, seus comportamentos, dores e motivações.
- Idear, Prototipar e Testar podem ocorrer entre Stage 0 e Stage 1, como um ciclo exploratório que gera aprendizados e direciona a formulação do escopo inicial do projeto.
Essa abordagem evita que projetos cheguem ao Gate 1 com premissas frágeis ou soluções centradas apenas na tecnologia ou no negócio. Em vez disso, trazem propostas mais equilibradas entre o que é desejável para o usuário, viável tecnicamente e viável economicamente — o famoso tripé da inovação.
Estudo de caso: Design Thinking aplicado ao Gate 1 em uma empresa de energia
Uma empresa do setor de energia renovável queria desenvolver um novo serviço digital para monitoramento de consumo energético residencial. A ideia inicial parecia promissora e foi rapidamente pré-selecionada para o Stage-Gate. No entanto, ao aplicar um sprint de Design Thinking no Stage 0, a equipe percebeu que o problema real dos clientes não era “monitorar”, mas sim entender e agir sobre os dados.
Esse insight levou à prototipagem de um assistente virtual de energia, que além de mostrar o consumo em tempo real, sugeria mudanças de comportamento e comparava o uso com padrões de eficiência. O protótipo foi testado com 15 usuários em menos de duas semanas e revelou uma aceitação 3x maior do que a solução original.
Quando o projeto foi apresentado no Gate 1, ele não era apenas mais alinhado com a dor real dos usuários, mas também vinha acompanhado de evidências concretas de valor percebido, usabilidade e intenção de uso. O comitê aprovou o avanço com base em dados qualitativos e quantitativos, e o projeto evoluiu com muito mais clareza e apoio.
Time multidisciplinar: peça-chave para o sucesso no Stage 0
Para que o Design Thinking realmente funcione no Stage-Gate, é essencial contar com times multidisciplinares e, mais importante, com autonomia para explorar, testar e errar rápido. Um time eficaz no Discovery deve reunir diferentes perspectivas — design, negócios, tecnologia, marketing, atendimento — para construir uma visão rica do problema e cocriar soluções inovadoras.
Além disso, o papel da liderança é crucial. Não basta delegar a fase de descoberta para uma equipe isolada; é preciso criar um ambiente onde a experimentação seja valorizada e os aprendizados iniciais tenham peso nas decisões dos gates. Líderes que atuam como facilitadores — e não como julgadores — criam as condições para que o Design Thinking realmente agregue valor.
Prototipagem e validação: a ponte entre ideias e business cases sólidos
Um dos maiores desafios enfrentados pelas equipes de inovação é construir business cases convincentes com pouca informação disponível. Nos estágios iniciais do Stage-Gate, especialmente antes do Gate 2, há muita incerteza sobre o mercado, a viabilidade técnica e a aceitação do usuário. E é justamente aí que a prototipagem e os testes derivados do Design Thinking se mostram poderosos aliados.
Ao criar protótipos — que podem variar de wireframes simples a maquetes interativas — e testá-los com usuários reais, a equipe coleta dados tangíveis sobre usabilidade, atratividade e intenção de uso. Esses dados, quando bem documentados, alimentam o business case com evidências reais, não apenas estimativas. O comitê de decisão passa a ter mais clareza sobre o potencial da ideia e mais segurança para aprová-la.
O processo de prototipagem favorece o refinamento da proposta de valor. Ao observar como os usuários interagem com a solução, muitas vezes surgem insights que mudam o foco inicial do projeto ou apontam para necessidades ainda não mapeadas. Assim, mesmo que o projeto não avance, o aprendizado é preservado e retroalimentado no pipeline.
6 Perguntas Frequentes sobre Design Thinking nos Estágios Iniciais
1. O Design Thinking substitui o Stage-Gate?
Não. Ele complementa o processo, principalmente nos estágios iniciais, oferecendo uma abordagem centrada no usuário e focada em experimentação antes de formalizar grandes investimentos.
2. Em que estágio aplicar o Design Thinking?
Idealmente, no Discovery (Stage 0) e até o Gate 1. Ele também pode ser útil no Stage 2, quando se busca validar escopos e funcionalidades específicas.
3. Quanto tempo leva um ciclo de Design Thinking?
Depende do escopo, mas é possível conduzir ciclos intensivos de 1 a 3 semanas. O importante é manter foco, agilidade e proximidade com o usuário.
4. Como lidar com a resistência interna à experimentação?
A chave é envolver stakeholders desde o início, mostrar resultados rápidos (quick wins) e alinhar as práticas com os objetivos estratégicos da organização.
5. É necessário ter um time de design dedicado?
Não necessariamente. Com capacitação adequada, qualquer time multidisciplinar pode aplicar os princípios do Design Thinking com sucesso.
6. E se os testes mostrarem que a ideia não tem valor?
Esse é um ótimo sinal. Significa que você evitou um investimento maior em uma solução sem fit com o mercado. Inovar também é saber parar cedo.
Conclusão: mais empatia, menos desperdício, mais inovação real
O Design Thinking oferece um novo olhar sobre os primeiros estágios do Stage-Gate. Ao colocar o usuário no centro, promover a experimentação e valorizar o aprendizado, ele transforma ideias soltas em propostas validadas, relevantes e com maior chance de sucesso.
Integrar essas práticas ao seu processo de inovação não exige revolução, mas sim intenção. Comece incorporando pequenas rodadas de prototipagem, entrevistas com usuários ou sessões de cocriação. Com o tempo, esses hábitos se tornam parte da cultura de inovação da empresa.
Ao fortalecer o Discovery com Design Thinking, você não apenas melhora a qualidade das ideias que entram no pipeline, mas também cria uma base sólida de evidências para sustentar decisões mais estratégicas, colaborativas e humanas.